terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Happy New Year (I)- - Antes da Meia Noite

Part I

Estou no Dunkin' Donuts da 132 Nasau Street, mesmo perto do cemitério das Twin Towers e da vibrante jukebox financeira de Wall Street. Não sei bem o que fazer com o tempo que me resta de 2007. Entretanto passo-o num Dunkin’ Donuts...

O plano era simples, comer num sítio recomendado por uma revista de recomendações (Time Out NY) e partir para a descoberta de Nova Iorque by New Year’s Eve, ver o fogo de artíficio na Brooklyn Bridge e ir para casa. Pronto.
Antes o plano era ainda mais simples. Ver a bola descer de Times Square. Pronto. Mas depois de me aconselhar vim a descobrir que:

1) a bola desce passadas 4 horas de sofrimento em pé (se se quiser ver a bola de facto a descer),
2) depois de se ser revistado,
3) e emparedado entre as grades de segurança, sozinho, juntamente com um milhão de pessoas,

Para além disso, não se podem levar bebidas alcoólicas, o que me levou a pensar que no meio da celebração iria ter que levar com uma alegria histérica estereotipada e não aditivada (portanto – falsa), para além de ter de gramar com os pombecos aos beijos a fazer resoluções de ano novo. Prefiro o fogo de artíficio.

Havia por isso o Plano B. Passar o fim de ano a ouvir à borla uma orquestra numa tal de Igreja de S. Bartolomeu onde mesmo mesmo na altura do ano novo se tocaria uma Fanfarra para um Homem Simples, de Aaron Copelan ... que é o mesmo que dizer, uma fanfarra dos tristes... Não era mau Aaron CoplandFanfare for the Common ManEra capaz de ser inspirador, catárquico, um banho de humildade, partilhado com os simples, que é o mesmo que dizer, com os tristes. O problema de tudo isto é que não haveria fogo de artíficio, dentro da igreja não há fogo de artificio, não vá um projéctil chinês atingir o Cristo na Cruz e lá se vai o hospicioso ano de 2008 mergulhado na fúria apocalíptica! Resta-me então o Dr. Phill...


Part II

O 31 foi um dia cansativo. Comecei na Penn Station (34th Street), andei um pouco às voltas fui de metro até à 4th street, e desci a Broadway, depois de ter visitado a reputada Bleecker Street, com as suas lojas trendy e tal. Das lojas, só mesmo o tal e como a Bleecker Street é pouco maior que a Rua do Ouro tinha tempo suficiente para gastar a descer a Broadway a partir daí.

Tempo é pois o que me tem sobrado neste countdown. Como durante todo o finado 2007, não sei bem o que fazer das minhas horas.

Descendo a Broadway passei, sem saber, pelo Soho e a TriBeCa, cheias de lojas, menos trendys mas mais fashion e crowded e tal. Sem saber também, ainda passei por um cheirinho da Chinatown e fui parar já de noite, também sem querer, ao cemitério de 11 do 9 de 2001. Na Downtown vi uma igreja, queria descansar um pouco, dei a volta ao gradeamento à procura da porta de entrada e lá estava o Ground Zero, e a porta da igreja fechada. Pudera!, aquilo à volta parecia o Marquês quando o túnel estava ainda ser construído.
Os heróis -na América há muitos heróis- estavam lá em baixo no buraco, a empacotar alicerces na lama em vésperas de ano novo. Por todo o lado se ouvia o bater acelerado do coração de betão – chunk! chunk! chunk!

Lá ao fundo o rio Hudson, um jardim, um banco, um cigarro e a estátua da Liberdade. Harry James & His OrchestraYou Made Me Love You
Part III

Eram ainda sete, mas esta gente janta cedo. Procurei então o tal sítio recomendado - Bennie’s Thai Café. Estava fechado. Dentro do restaurante tailandês, um grupo de peruanos (ou parecido) estava já a preparar as festividades para acolher 2008. Olharam-me de lado quando me aproximei da porta, não deveriam querer partilhar comigo o ritual Inca de sacríficio da virgem que decerto preparavam. Acabei por isso a comer num chinês bastante duvidoso, daqueles que fariam corar os piores Mings da Mouraria. Pedi o que quer que o chinoca patrono me recomendasse, já que não percebia nada do menú. A minha última refeição de 2007 deve ter sido chinês emigrante feito em puzzle, com molho picante e bróculos. Visto bem as coisas, há que comemorar a ascensão da China a potência mundial, económica e cultural. Saí enjoado, bebi três tragos dos 250ml de Vodka que tinha comprado muito antes numa liquour store algures ao pé da Chinatown, dei três voltas ao quarteirão e fui à procura do Dr. Phill.

Part IV

No Dunkin’ Donuts do 132 da Nasau Street já estavam à espera de começar a tour um par de happy american families, mais uns quantos geeks vindos da Columbia Univ. Estava lá também uns comparsas e o próprio Dr.Phill, uma espécie de Michael Moore com um gorro rídiculo contra o frio e a forma engraçada que o pinguins têm de caminhar. Entretanto mais turistas incautos e famílias com licensa de porte de arma hereditária entravam para se inscrever na tour. Nessa altura percebi que a companhia dos tristes na sinfonia de ano novo teria sido uma escolha sábia...

Indeciso, dei três voltas ao quarteirão, sentei-me numa boca de incêndio a olhar para um arranha-céus alto e luminoso. Fumei um cigarro sobre o assunto. Uns tipos chinocas duvidosos pararam o carro ao pé de mim enquanto ouviam uma treta qualquer de hip-hop-R&B-Rap igual a tantas outras músicas que qualquer nova-iorquino que se preze ouve nesta cidade, sem distinção de cores, etnias ou o que seja. Eles lá sabem, gostos não se discutem.
Não obstante a presença do gangzito asiático não ter nada de mal, (preparavam-se também eles para comemorar a mudança significante nos calendários ocidentais) levantei-me da boca de incêncio e rumei ao Dunkin’ Donuts pronto a enfrentar o Dr. Phill, a colar um autocolante amarelo fluorescente e a dar um passeio pela Downtown by night a caminho da Brooklyn Bridge.

Part V

Estou sentado no Dunkin’ Donuts 132 da Nasau Street. Neste momento a clientela é mais que muita, o Dr. Phill já deve estar cheio de doláres e eu ainda não decidi o que fazer com as minhas últimas horas de 2008. Só sei que fico pior que estragado se o fogo de artifício não fôr ao menos semelhante ao do Terreiro do Paço.

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